Falta-me a inspiração dos teus ombros sobre o meu corpo, a segurança do cheiro da tua pele, a tua cara a dormir na almofada ao meu lado, tranquilo e belo como um querubim. Faltam-me o teu tempo e a tua respiração. Falta-me a tua mão na minha, quando ando na rua. E o teu olhar a envolver-me como um manto e o teu coração a bater ao mesmo tempo que o meu.

Fazes-me falta. E a falta que me fazes não se resgata nas palavras, nas esperas, na conjugação estóica do verbo aceitar, nem na assunção lógica da temporalidade. Mas mesmo assim, escrevo porque ninguém ouve, e quem sabe, uma simples folha contenha a chave da liberdade. Porque só é livre quem abraça o mundo sem reservas, mesmo que fique pendurado por um fio entre a vida e a morte.

 

Há uns cem anos atrás, Benjamin Franklin compartilhou com o mundo o segredo do seu sucesso. Nunca deixes para amanhã, disse ele, o que podes fazer hoje. Este é o homem que descobriu a electricidade. Tu pensas que mais pessoas iriam ouvir o que ele tinha para dizer. Eu não sei porque adiamos as coisas, mas se tivesse que adivinhar, tinha que dizer que tem muito a ver com o medo. O medo do fracasso, medo da rejeição, às vezes o medo é de apenas tomar uma decisão, porque e se estiveres errado? E se estás a cometer um erro e não o podes desfazer ? O pássaro madrugador apanha a minhoca. Um ponto a tempo, economiza nove. Aquele que hesita está perdido. Não podemos fingir que não tinha sido dito. Todos nós já ouvimos os provérbios, ouvimos os filósofos, ouvimos os nossos avós a dizer para não perdermos tempo, ouvimos os chatos dos poetas a dizer para aproveitarmos o dia. Ainda às vezes temos que ver por nós próprios.. Temos que cometer os nossos próprios erros. Temos que aprender as nossas próprias lições. Temos a possibilidade de varrer o que é de hoje, para debaixo do tapete de amanhã até não podermos mais. Até que, finalmente, compreendemos o que Benjamin Franklin quis dizer. Que o saber é melhor do que saber, que o despertar é melhor que dormir, e até mesmo a maior falha, mesmo o pior, Vence o nunca ter tentado.

[o que ele está a fazer, é o que tu deverias ter feito]

 

Mas o fio da vida vai tecendo à minha volta uma teia cada vez mais grossa e opaca, e sinto-me prisioneira do tempo e do silêncio.

 

No fim do dia, a fé é uma coisa engraçada. Acontece quando menos esperas. É como se te apercebesses que o conto de fadas pode ser ligeiramente diferente do que sonhavas. O castelo, bem, pode não ser um castelo. E o "felizes para sempre" já nem é tão importante como era, agora só o Feliz importa. De vez enquanto, numa lua azul, as pessoas vão surpreender-te, e de vez enquanto, as pessoas podem-te tirar o fôlego.

Lembras-te quando eras criança e acreditavas nos contos de fadas, que a fantasia da tua vida seria, o vestido branco, o Príncipe Encantado que te iria levar para um castelo numa colina. Tu deitavas-te na cama, fechavas os olhos e tinhas a fé, completa e absoluta.O Pai Natal, a Fada dos Dentes, Príncipe Encantado, que estavam tão perto que quase conseguias prová-los, mas eventualmente cresces, e um dia abres os olhos e o conto de fadas desaparece. A maioria das pessoas voltam-se para coisas e pessoas que podem confiar. Mas o problema é que, é difícil largar totalmente o conto de fadas, porque quase toda a gente ainda tem aquele pedacinho de esperança, de fé, que um dia destes vão abrir os olhos e tudo se vai tornar realidade.

Nunca sabes o que queres e vives tão perdido nas tuas dúvidas que nem sequer consegues perceber o mal que podes infligir aos outros. Sabes, quando queremos algo há sempre meios disponiveis para tal, mesmo que seja o pior dos teus pesadelos. O problema é que tu não te esforças, ao primeiro obstáculo desistes, assim do nada, mesmo muito facilmente. E como consequência desse tal acto, não irás usufruir dos teus sonhos, e assim sendo acabarás por viver numa teia de mentiras e desculpas. As pessoas iram se cansar de te ajudar, pois fazes sempre a mesma coisa, segues o teu caminho como se não pudesses mudar de rota.

Mas, podias-me ter dito que querias conjugar o verbo desistir. Não sei como se diz desistir na tua língua nem quero aprender, porque na minha demorei muito tempo a aceitar que, às vezes, desistir é o mesmo que vencer sem travar batalhas. Antigamente pensava que não, que quem desiste perde sempre, que a subtracção é a arma mais cobarde dos amantes, e o silencio a forma mais injusta de deixar falecer os sonhos. Mas a vida ensinou-me o contrario. Hoje sei que desistir é apenas um caminho possível, às vezes o único que os homens conhecem.

Quando durmo, sonho contigo e, quando acordo, desejo ter-te nos meus braços. O tempo que vivemos separados mais não fará do que convencer-me ainda mais, se tal for possível, de que quero passar as noites que me restam ao teu lado e os meus dias contigo no coração. Quando estou a escrever-te, sinto o teu hálito, e imagino que sentes o meu quando lês o que escrevo. Também se passa o mesmo contigo? Estas cartas são agora parte de nós, parte das nossas história, uma recordação eterna do que fizemos com a nossa vida. Agradeço-te por me teres ajudado a sobreviver este ano mas, ainda mais importante, agradeço-te, antecipadamente, por todos os anos futuros. Pensar em ti é, quantas vezes, a única coisa que me dá vontade de continuar.

 (continua)